14 abril 2007

Palavra de Escritor - Palavra de Força

Escrevi há tempos um post com algumas citações sábias de António Lobo Antunes, em consequência da minha recente decisão de ler um livro dele. Foi decisão, mesmo, não um livro que por acaso me caíu no colo.
Como muita gente, já ouvi falar muito do escritor e da sua obra, mas nunca tinha lido nada dele. A decisão veio do meu espírito curioso: li várias vezes que se trata de um sério candidato ao Nobel e que a sua escrita é mais difícil que a de Saramago - algo que, confesso, me pareceu impossível. Aproveitei portanto a estadia pascoal na Terra do Nunca para explorar a recheada prateleira que lá mantenho, em esforço conjunto com os meus progenitores. E encontrei por lá o título "Explicação dos Pássaros". Na 1ª página, a minha assinatura pela mão conflituosa da adolescência, dita por baixo a data: 2/02/97, livro a fazer parte da colecção "40 anos RTP". Refeita deste confronto com o meu próprio envelhecimento - a RTP fez ainda agora 50 anos - verifico que tentei ler o autor com apenas 15 anos, razão para mim suficiente para não ter passado, suponho, da 2ª-3ª página (sempre fui precoce, mas só nas intenções).
Vou sensivelmente a meio do livro. Percebo já que se considere a escrita difícil e, arrisco, só um psiquiatra de formação poderia escrever assim. Lê-se como quem pensa. (E, como futura médica, com inclinação para a mesma especialidade, percebo-o muito bem.)
Por ironia, o meu Alertas Público chamou-me a atenção para a crónica desta semana de Lobo Antunes na Visão.
Referindo-se ao livro que está prestes a ser publicado, diz o autor "Esse livro tem a melhor prosa que fiz até hoje, parece recitado por um anjo. Aquele em que trabalhava é apenas um embrião, cerca de metade do primeiro esboço, falta-lhe tudo. Voltarei a ele? (..)"
Ora todos sabemos que, depois de um livro recitado por um anjo, segue-se inevitavelmente um segredado ao ouvido pelo próprio Diabo (indubitavelmente melhor), de maneira que esse primeiro esboço está destinado a ensombrar tudo o que antes foi escrito. E, claro, como qualquer escritor é escravo do seu próprio dom, creio de Lobo Antunes está destinado a voltar a ele. Ficamos à espera.

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